Nosso artigo “Brasil de 1492 a 1889: Fake News desde sempre” de 13/09/2020, foi republicado pelo “jornal A Tribuna” em 16/09/2020, em versão curta, com nossa revisão, com o título de “Fake News desde sempre”.
Versão completa do artigo: https://webapp381390.ip-45-56-126-89.cloudezapp.io/?p=3606
- por Samir Keedi e Claudir Franciatto
No best seller Sapiens – Uma Breve História da Humanidade, Yuval Harari nos fala de como, já na pré-história, surgem fofocas e mentiras como manifestações espontâneas da própria coletividade, comunidade ou raça. O que nos faz lembrar também desde as ardilosas falácias das comédias shakespearianas até a transmissão radiofônica de Orson Wells, em 1938, semeando pânico diante de uma inventada e improvável invasão marciana. Em resumo, as fake news existem desde sempre.
Entretanto, o local onde elas mais gostam de morar, procriar e proliferar talvez seja mesmo aqui, em território tupiniquim. Já nasceu assim. A marchinha de Lamartine Babo que cantava lá pela década de 1940 “Foi Seu Cabral, no dia 21 de abril, dois meses depois do carnaval”, errava na data. Mas se na letra constasse 22 de abril, também estaria equivocada, assim como os nossos antigos livros de história. O certo seria 12 de outubro de 1492. Porque chega a ser surreal acreditar que Cristóvão Colombo teria descoberto a América fazendo uma mágica esquisita ao deixar o Brasil de fora. Pergunta óbvia: por que a data de 22 de abril não é feriado desde 1930?
Muito pior ocorre quando chegamos ao histórico ano de 1822. Desde os incômodos bancos escolares aprendemos ser o inquestionável proclamador da independência brasileira o imperador D. Pedro I. Aquele que, na verdade, só soube do ato que lhe é imputado cinco dias depois! Quando, sem mais nada o que fazer, de forma redundante e desnecessária, montado num cavalo às margens de um rio, declara o Brasil livre de Portugal pela segunda vez.
O “grito do Ipiranga” tornou-se um mito, soterrando a verdade inexplicavelmente. Sim, porque a independência do Brasil ocorreu no próprio palácio em 02/09/1822. Foi proclamada pela Princesa Leopoldina que, ao lado do santista José Bonifácio de Andrada e Silva, justamente perpetuado na história como o Patriarca da Independência, assinou e selou o decreto libertador.
O estranhamento aqui manifestado se explica ainda por outros fatos. Também é de responsabilidade da Princesa Leopoldina a escolha das cores verde e amarelo da nossa bandeira. E nada tem a ver com a difundida e falaciosa história de representarem nossas matas e o nosso ouro. Foram adotadas, isto sim, seguindo ideia da princesa, por serem identificações das duas Casas imperiais que originaram o Brasil independente: o verde simbolizando a Casa de Bragança, de dom Pedro I, Portugal e, o amarelo, a Casa de Habsburgo, de Maria Leopoldina, Áustria.
E poderíamos trazer à tona inúmeros outros casos que recheiam de ficção os livros de história, como por exemplo o do engodo criado em relação à proclamação da República. Neste caso, a realidade é que O Marechal Deodoro da Fonseca antecipou o evento histórico, do qual foi convencido a participar mesmo sendo monarquista, apenas em função do medo de um falso pedido de prisão contra ele.
Portanto, vê-se que fake news, notadamente no Brasil, nada têm a ver com este milênio ou esta década. Trata-se de algo incrustrado na tradição e na cultura de um povo afeito ao “jeitinho” que tudo resolve. Nossa maneira de driblar a realidade sem grandes questionamentos e culpas. Exatamente como vem ocorrendo e se agravando depois da vitória de um governo conservador que sofre das injúrias e difamações de uma oposição totalmente sem escrúpulos.
- Samir Keedi, professor e escritor
- Claudir Franciatto, jornalista e escritor
Jornal A Tribuna