Porto de Santos – Local ou internacional?
Quem tem acompanhado o noticiário dos últimos anos, assistido palestras, ouvido promessas , etc., tem criado muitas expectativas sobre o Porto de Santos. E que será um hub port natural para a América do Sul. Essa é uma situação inevitável aos olhos de todos e ninguém consegue imaginar o contrário.
Aqui de nosso canto, de observador do que se passa e das ações que se tomam, e que torcemos muito por isso, e queremos ver Santos como hub port, já não vemos a coisa tão natural. Em meados da década de 90 também nós estávamos na euforia de todos, mas alguns de nós tinham que “cair na real” algum dia.
Depois de todo esse tempo, e de vermos promessas sempre renovadas e nunca cumpridas, começamos a conjecturar sobre qual a realidade futura do Porto de Santos. E nossa preocupação maior é vermos que, enquanto muitos portos ao redor do mundo tornam-se globais, vide os portos chineses, por exemplo, assim como de outros países, Santos continua quase igual. Tem sido um porto, a exemplo do próprio país, sempre do futuro. O Brasil é o país do futuro desde seu descobrimento. Enquanto isso, os outros tornam-se futuro e nós continuamos atrelados ao passado. Quem sabe mudamos algo se contratarmos o Robert Zemeckis – “De volta para o futuro”.
Parece que Santos não consegue se livrar da miopia de ser um porto local, e enxergar longe pretendendo ser talvez o hub port do Mercosul. E o ponto a que chegou parece ter sido fruto do acaso, por conta da economia regional, em que, coincidentemente, o Estado de São Paulo é a grande locomotiva nacional. Assim, com uma importância e crescimento empurrados pelas circunstâncias e não por ações coordenadas e planejamento estratégico efetivo encontramos a dona dos ativos e administradora portuária.
Nossa pergunta crucial é: o que o Porto de Santos quer ser quando crescer? Esperamos que a resposta não seja “salsicha da Perdigão”, como se costumava brincar na minha juventude, que já vai longe, mas o maior e melhor porto da América do Sul, quiçá, das Américas.
Mas, para isso, é necessário muito trabalho e cumprimento de promessas. Uma dessas promessas é a dragagem do canal do estuário. Não falamos em dragagem normal, que nada muda e apenas mantém o status quo, mas a de levar o porto a 14/15 metros e até 17 metros de profundidade. Todos sabem que os navios de 10.000 TEU – twenty feet or equivalent unit (containers de 20 pés, igual a 6,09 metros), grandes até há uns 2 anos, hoje já são passado, com navios maiores em operação. E essas embarcações têm calado de 14-16 metros. Será que a dragagem acontece? Vamos torcer para que Santos não tenha que se contentar em operar, no máximo, navios como os do tipo da armadora alemã Hamburg Sud, de 5.560 TEU, e que ainda assim não podem entrar ou sair do canal com lotação total, porque tem que considerar profundidades máximas de 13 metros.
E quanto aos acessos, nem é preciso comentar: os problemas são visíveis a qualquer observador. Conforme já escrevemos há alguns anos, as vezes é possível ir de avião a Paris ou Oslo mais rapidamente do que se leva uma carga de São Paulo a Santos, ou mesmo num transporte dentro da cidade de Santos. Será que um dia o “estadual” deixará de brigar com o “federal”, e o “municipal” com o “estadual” e um com outro e o outro com um? Será que um dia haverá harmonização dos diversos interesses políticos em prol do verdadeiro desenvolvimento?
As perimetrais ainda são sonhos, embora pareça que agora elas podem mesmo sair do papel visto que algo já está se fazendo. O mergulhão… este é sonho de uma noite de verão! É fundamental que se separe o porto da cidade. A cidade tem que entender que o porto é seu maior ativo, e trabalhar para que ele seja um dos maiores ativos do mundo, o que lhe trará orgulho, satisfação, renda e crescimento econômico.
A cidade e o porto de Santos precisam começar a pensar grande, o que talvez nunca tenha efetivamente ocorrido. E é claro, não depende apenas de nós pobres mortais comuns. Não depende apenas dos terminais criados pela Lei 8.630/93, com operação privada. Estes vêm realizando um trabalho maravilhoso, transformando o cenário caótico que existia antes . E não é preciso citarmos todos, mas tão somente os de nosso cotidiano, os de containers.
E pensar grande não é apenas sonhar e colocar no papel, que assim tudo continua igual. Pensar grande é ter obstinação por realizar, é baixar “um chinezinho” dentro de cada um de nós, é encarar de frente as mudanças, é fazer o que é preciso e não somente o que é possível. E, com certeza, se desvencilhar das amarras locais, abandonar o provincianismo nefasto e planejar o futuro sem medo, realmente com vontade (política?) de dar ao nosso país o grande porto que ele merece.
Bill Moses: God must have been a shipowner. He placed the raw materials far from where they are needed and covered two thirds of the world with water.
Revista ABTRA 20 anos