Qual o valor dos Incoterms®? 1000, 100, 10 ou 0 (zero)?
Esta pergunta pode parecer estranha à maioria dos leitores e profissionais de comércio exterior. Em especial aos nossos leitores, profissionais e amigos. Já que nos lêem e ouvem sempre que ele é o instrumento mais importante do mundo em comércio exterior. Tudo começa com ele. Com uma compra e venda. Sem essa operação, sequer existe comércio exterior. Nem mesmo comércio interno.
Mais do que termos de compra e venda, portanto de entrega, ele é princípio de qualquer processo logístico. Portanto, este importante instrumento é logística pura. E quem nunca o encarou assim, pode começar agora, sempre é tempo. Escolheu um termo, automaticamente dividiu a logística entre as partes.
Mas, então, porque essa pergunta estranha? Ela não é estranha. É apenas como os Incoterms® são encarados na prática, infelizmente. O que pode parecer inacreditável, e na verdade é.
Por ser um padrão internacional, e único no caso, ele é fartamente utilizado. Embora a maioria dos profissionais não o conheça efetivamente. A maioria sequer sabe a razão da sua existência, porque ele foi criado. Nem o que ele faz e as partes entre quem ele divide as responsabilidades.
Mais de meio século de trabalho, mais de um quarto de século de consultoria e sala de aula na Aduaneiras e Instituições Universitárias, nos deram essa certeza. No nosso curso de Incoterms®, sempre consultamos nossos alunos, cuja maioria é de profissionais, se a empresa tem o livro oficial da ICC – International Chamber of Commerce. E notamos que, pelo menos 90%, não o têm. Às vezes mais. Sugerimos, então, comprá-lo, visto ser impossível trabalhar com esse instrumento, sem ter esse livro. E, ao longo do curso, isso fica claro a todos. Conhecimento não cai do céu. É aprendido em livros, cursos, etc.
E, nos últimos anos, essa certeza ficou mais clara, ao ver que importantes instituições, além de não o conhecerem como se deve, não o respeitam. Como as seguradoras, corretoras e, pasmem, o Judiciário no meio. Este sequer tem algum entendimento razoável em comércio exterior, pelo que já percebemos ao longo do tempo. Sobre Incoterms® então…. O que significa que os litigantes, numa pendenga, ficarão a ver navios, já que 95% do comércio exterior brasileiro, fisicamente, ocorre por esse modo (e não modal como nossos profissionais pensam e acreditam que é) de transporte marítimo. Já vimos coisas inacreditáveis dos comerciantes, das seguradoras e do judiciário.
Os comerciantes, em sua maioria, sequer sabem onde se dividem as responsabilidades, que são os riscos e custos de uma entrega. Que, aliás, são as únicas coisas que os Incoterms® fazem. Dividir riscos e custos entre as partes. E a maioria, também, sequer sabe quem são essas partes, julgando-as serem exportadores e importadores. Mal sabem o erro que cometem ao pensar e falar isso. Os Incoterms® dividem custos e riscos entre vendedores e compradores, ninguém mais.
E, ainda, nem sabem como incorporar os Incoterms® ao seu contrato de compra e venda. Entendem que basta colocar o termo e o local ou porto e, posteriormente, na fatura comercial, e está resolvido. Numa disputa entre as partes, ninguém saberá quem tem razão. Não terão colocado o instrumento e o ano que rege a compra e venda e ninguém terá como julgar o caso. E, se comprar dos Estados Unidos da América, poderá vir a ter uma complicação adicional com os termos do comércio norte-americano, o RAFTD – Revised American Foreign Trade Definitions, 1941 que, também, por serem usos e costumes, são usados, ainda que pouco. Em que, de 14 termos, 6 são “FOB”. Já vimos muitos problemas sobre isso, por falha no contrato de compra e venda em determinar qual o instrumento sendo utilizado.
Sequer sabem, em especial nos termos do grupo “C” dos Incoterms®, que são “CPT, CIP, CFR, CIF”, onde os riscos são divididos entre vendedor e comprador. Acreditando que eles andam junto com os custos, como ocorre com os termos dos grupos “E, F, D”. Achando que a menção de um local ou porto determina, por si só, a divisão de riscos entre as partes.
Aí vemos vendedor contratando seguro nos termos “CIP – Carriage and Insurance paid to” e “CIF – Cost, Insurance and freight”, com ele próprio como beneficiário, o que não faz o menor sentido e é um “contrassenso”. E, com a seguradora fazendo essa contratação insólita para o vendedor. E por que é insólita? Pelo simples fato de que o vendedor não é mais o dono da mercadoria e o transporte internacional não é da sua conta. Então, como contratar seguro para quem não é o dono da mercadoria?
E o que acontece fazendo dessa forma é algo inaceitável. Com a entrega da mercadoria na origem, ou com a sua colocação a bordo do navio, ela já é do comprador. Assim, o comprador já tem obrigação de pagar o vendedor. Aí, nesse caso, se houver uma avaria ou perda da mercadoria, o vendedor recorrerá à seguradora, e receberá a indenização. Portanto, recebendo duas vezes pela mesma mercadoria. De seu lado, o comprador, que pagou e é dono da mercadoria, não receberá sua indenização, e perderá. Ficará sem a mercadoria e o seu dinheiro. Se o comprador cometer o mesmo erro do vendedor, e também contratar o seguro para o “CIP ou CIF”, com erro também da outra seguradora, teremos a chamada concorrência de seguros, ou seja, dois seguros para o mesmo interesse segurável. No total, teremos quatro erros. Do vendedor, do comprador e das duas seguradoras. E três valores pagos para uma mesma mercadoria, quando, num caso como esse, deveria haver apenas dois.
E, temos também o judiciário, que ao julgar uma pendenga, não leva em consideração os Incoterms®, podendo dar ganho de causa à parte errada. Ao vendedor se a operação for num dos termos dos grupos “E, F, C”, quando o ganho deveria ser do comprador. E ao comprador no grupo “D”, quando o ganho deveria ser do vendedor.
Conclamamos vendedores, compradores, seguradores, corretores e judiciário, bem como muitas outras partes que podem estar envolvidas, a estudarem, terem o livro oficial dos Incoterms®. Para, simplesmente, não cometerem erros primários, insólitos e irreparáveis. Tendo como perdedor um possível vencedor, e vice-versa, permitindo o injusto como justo.
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