AFRMM, DFMM, DI, e fome arrecadatória
O Brasil é um país em que parece que a única coisa que interessa é a arrecadação. O poder não se contenta com o anormal já arrecadado. Que é muito além de qualquer lógica ou necessidade. É a contínua opressão ao contribuinte. Continuamos, realmente, um país estranho. E, nunca como dantes neste país.
Parece que poucos continuam mantendo a capacidade de raciocínio. De entender que quanto mais tributo, menos consumo, menos emprego, mais criatividade para tentar evitar o pagamento, etc. Quer dizer, menos atividade econômica. Ano após ano temos visto aumentos contínuos dos impostos neste Brasil varonil, cor de anil.
Como se já não bastasse esse tipo de coisa, agora temos agravado o problema com o AFRMM – Adicional ao Frete para a Renovação da Marinha Mercante. Sabemos que este é um adicional recolhido desde 1958. E que muito, muito dinheiro já foi arrecadado. E que o mínimo foi colocado para o que realmente foi criado. Aliás, a exemplo das famigeradas CPMF, CIDE e outros subterfúgios para mera arrecadação central. Tributo disfarçado com suntuosos apelidos.
Tivessem esses recursos do AFRMM sido aproveitados onde deveriam, teríamos uma boa armação hoje no Brasil. Bom, não quer dizer que não temos uma boa (sic). Nunca teríamos deixado de ser o segundo maior produtor de navios do planeta. Nem teríamos baixado nosso transporte em bandeira brasileira. Que foi de 30% até o início dos anos 1980. Hoje é de quase zero.
Todos sabem que a Lei 10.893/04, que dispõe sobre o AFRMM, já tem uma falha grave. Que pode ser creditada ao total desconhecimento do que significa capatazia. Que na movimentação de container é chamada de THC – terminal handling charge, ou seja, despesa de manuseio no terminal. Todos que têm um mínimo de conhecimento, sabem que estas despesas ocorrem no país, depois da descarga da mercadoria na importação. Se for na exportação, antes do embarque. Numa situação ou outra, é despesa nacional, ocorrida e paga no país. Assim, nada tendo a ver com o transporte, descarga ou embarque da mercadoria. É despesa de movimentação portuária, tão somente.
O artigo 5º da referida lei já tem, portanto, um equívoco. Inclui as despesas portuárias na base de cálculo do ARFMM quando mencionadas no conhecimento de embarque. Embora seja imoral, e equivocado, tudo bem, entendemos que deve ser pago, visto que está na lei. Até que a lei seja modificada, há que se suportar este fardo. Afinal, como reza o artigo 5º, o AFRMM incide sobre o frete, que é a remuneração do transporte aquaviário. E, tudo que está num conhecimento de transporte é frete, que deve menciona-lo. Vide Lei 556 de 25/06/1850, isso mesmo, 1850, o Código Comercial Brasileiro.
Não bastasse a lei equivocada falar na despesa colocada no conhecimento de embarque, agora temos mais novidades emanadas do DFMM – Departamento do Fundo da Marinha Mercante. De que a capatazia/THC deve fazer parte do frete para compor a base cálculo do AFRMM. Isso somente poderia ocorrer em nossas plagas (sic). Somente aqui, a fome arrecadatória poderia ser mais importante que a competitividade, emprego, consumo, crescimento, respeito, etc.
Por mais que se queira arrecadar, não se entende como se pode chegar a este exagero, flagrantemente imoral e um contra-senso. A capatazia/THC é uma despesa que ocorre depois do transporte e da descarga da mercadoria, como já retro-colocado. E, se ocorre apenas naquele momento, e em território nacional, não pode haver a menor base legal para sua cobrança. Mesmo que se queira criar uma base legal, não há respaldo lógico para o fato.
Assim, mesmo quando esta despesa está mencionada no conhecimento de embarque, manda a lógica e o bom-senso que ela seja retirada da base de cálculo.
Pena que a cada dia se criem novos problemas para os importadores brasileiros. Sem contar os exportadores, embora, desta vez, estes não estejam sendo penalizados.
Ninguém está preocupado com a competitividade do produto brasileiro, nem com a capacidade logística do país. É só olhar e ver o que vem acontecendo nos últimos anos.
É incrível como este país insiste em andar de marcha-a-ré. Ainda que nosso veículo logístico tenha tantas marchas à frente. Que estão ficando cada vez mais atrofiadas.
No dia em que a arrecadação pela arrecadação deixar o status da coisa mais importante que existe no país, começaremos a ganhar condições para o desenvolvimento. Só que parece não haver qualquer chance disso para quem já nasceu, ainda que tenha sido hoje.
O pior é que este conceito já vem sendo utilizado também pela RFB – Receita Federal do Brasil, na valoração aduaneira, há muito tempo. Gerando pagamentos adicionais de tributos por conta da inclusão da capatazia/THC. O que ocorre no registro da DI – declaração de importação. E, mais grave ainda, por nem estar previsto no RA – Regulamento Aduaneiro. Neste, em seu artigo 77 inciso II, se lê “os gastos relativos à carga, à descarga e ao manuseio, associados ao transporte da mercadoria importada, até a chegada aos locais referidos no inciso I”. O incíso I reza “o custo do transporte da mercadoria importada até o porto….”. Portanto, o RA não fala em despesa portuária.
revista Trade and Transport