Emprego sem crescimento?

Voltando ao assunto do emprego com carteira assinada, após pouco mais de três anos, continuamos nos perguntamos o que está acontecendo com o nosso país. E nunca deixamos de nos espantar com os dados que nos são passados. Que são estranhos considerando os fatos reais, que acompanhamos e analisamos. Parece que voltamos a um passado não tão distante, em que nunca se podia confiar nos números, em que parecia que a “matemática se enganava” (sic). Um bom exemplo hoje é a inflação, parada em menos de 6%, quando todos sabem que está fora de controle e bem mais alta.

É incrível como se escamoteia a verdade, sempre passando à população uma “verdade’ que não existe. Ou contando apenas metade da missa. É difícil achar alguém que saiba o que está acontecendo de fato. Tudo pela forma como se colocam os assuntos ao povo. Como no livro “1984”, de George Orwell, em que a história é reescrita e mudada à conveniência e ao sabor dos ventos. Aqui, os ventos planaltinos da ilha da fantasia. Quem o conhece sabe do que estamos falando. Quem não o conhece, sugerimos esta excelente leitura para entender o mundo, em especial o Brasil.

E o emprego, como citado no início, é outro deles. E ninguém parece dar-se conta. E se percebem, calam-se. Especialmente a imprensa. Ela que tudo acompanha e nada contesta. Até parece que não há números em que se possam basear, mesmo sendo abundantes. Ou então os esquecem. Também, bem sabemos o quanto a imprensa é livre (sic) neste país. Os magistrais economistas que temos idem. Em última instância, talvez o desconhecimento sobre o assunto. O que é plausível num país em que o nível educacional melhora a cada ano nas estatísticas, mas rola ladeira abaixo quanto aos conhecimentos.

Este atual governo, em seus 10 anos de “luta e labuta” (sic), vem noticiando um extraordinário aumento do emprego no Brasil. Sistematicamente 1,5 a 2 milhões de novos empregos a cada ano. Em 2011, salvo engano, foram noticiados a criação de quase 3 milhões de novos empregos. Em 2012 mais de 1,5 milhão. Isso significa que nesses 10 anos, pelos números divulgados a cada ano, foram criados algo como 15 ou 20 milhões de empregos.

Todos sabem, pelo sempre divulgado na imprensa, que no final do governo da legenda anterior, ao final de 2002, os empregos eram de cerca de 30/32 milhões de carteiras assinadas. Aceitando-se esses dados do governo anterior e do atual, significa que foram criados cerca de 50-60% de empregos sobre o estoque que já existia. Todos aceitam isso como uma verdade inconteste. Gostaríamos também de aceitar. E rejubilarmo-nos com o fato. Assim nossos irmãos brasileiros poderiam ter uma vida melhor. Com mais dignidade e, em especial, orgulho do país. Afinal, ele é nosso (sic).

Só que, segundo os últimos registros das nossas autoridades, não parece termos cerca de 50 milhões de carteiras assinadas. O que daria cerca de 50% da PEA – população economicamente ativa. É grande a tentação de nos perguntarmos onde estão os novos empregos. Onde foram criados. Aqui, nos empregos, mais do nunca, George Orwell, do livro retro-citado, é nosso guru. Em especial considerando nosso baixo percentual de desempregados, segundo nossas autoridades.

Como esses números podem estar corretos se nossa PEA é de cerca de 100 milhões de trabalhadores? É certo que temos alguns milhões de empreendedores – são 6 milhões de empresas no Brasil, segundo se sabe. Não sabemos o quanto isso representa em empresários, mas talvez possamos avaliar em 15-20 milhões, esperando estarmos certos. Ou seja, temos, pelo que se depreende, cerca ou mais de 30 milhões de almas desempregadas. Ou subempregadas, quer dizer, sem a bendita carteira assinada. Assim, não fica muito claro que esses empregos foram mesmo criados.

Ou não sabemos nada, nem uma simples aritmética, ou alguém está, no mínimo, “equivocado”. E passando informações erradas à frente. E ninguém se dá ao trabalho de parar para pensar no assunto e nas incoerências. Ou não interessa pensar, ou escrever, ou dizer, ou….

De toda essa “criação de empregos” com carteira assinada, fica mais uma pergunta que precisa ser respondida. Se criamos cerca de 50-60% de novos empregos sobre o que já existia, por que isso não se reflete em crescimento econômico? O crescimento brasileiro no período é bem menor do que os números que deveríamos ter.

Se analisarmos detidamente apenas os dois anos desta década, 2011 e 2012, a questão fica mais escancarada. Se criamos os números divulgados em 2011, deveríamos ter, nesse ano, no mínimo, um crescimento de uns 7% e, no entanto, o crescimento foi de 2,7%. No ano de 2012 deveríamos ter um crescimento de uns 4%, porém, parece que o crescimento pode ter atingido cerca de 1%. E isso, sem contarmos a produtividade brasileira, que sabemos não é zero. Assim, o mínimo aceitável nesses dois anos seria um crescimento de uns 8-9% e uns 5-6%.

Assim, fica claro que é impossível tal criação de empregos reais. E, conjecturando além de Sol, num esquema quentíssimo, se a maioria dos empregos já existia, e era sem carteira assinada, surgem mais dois problemas. Primeiro, o que estava fazendo o governo permitindo que as empresas contratassem sem registro, ao arrepio da Lei, e sonegando impostos? Segundo, se foram substituições de emprego informal por emprego formal, porque o governo fala em geração de empregos, ao invés da correta substituição de emprego informal pelo formal?

Que pena Brasil! Que pena!

Jornal Diário do Comércio

Jornal DCI

Author: Samir Keedi

-Mestre (Stricto Sensu) e pós-graduado (Lato Sensu) em Administração pela UNIP-Universidade Paulista. -Bacharel em Economia pela PUC-Pontifícia Universidade Católica. -Profissional de comércio exterior desde março de 1972. -Especialista em transportes; logística; seguros; Incoterms®; carta de crédito e suas regras; documentos no comércio exterior; contratos internacionais de compra e venda. -Generalista em várias atividades em comércio exterior. -Consultor em diversos assuntos relativos ao comércio exterior. -Professor universitário de graduação e pós graduação desde 1996. -Professor e instrutor técnico desde 1996. -Palestrante em assuntos de comércio exterior e economia. -Colunista em jornais e revistas especializadas. -Autor de vários livros em comércio exterior. -Tradutor oficial para o Brasil do Incoterms 2000. -Representante do Brasil na CCI-RJ e Paris na revisão do Incoterms® 2010.

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