Erros e pouca vontade de aprender – 2

 

No artigo anterior escrevemos o nosso “Erros e pouca vontade aprender – 1”. Sentíamos que precisávamos escrever algo do tipo para chamar a atenção de nossos profissionais e estudantes. Claro que isso não ocorre, e todo mundo sabe bem, apenas na nossa área de comércio exterior. Ocorre nos mais diversos setores. Mas, vamos ficar na nossa, para não entrarmos em seara alheia. Outros o farão.

Uma vez publicado o artigo, fomos surpreendidos, embora não muito, com a repercussão. Coordenadores de cursos e professores, profissionais, etc. se identificaram com ele e concordaram que é assim mesmo que se passa. Diante disso resolvemos, então, dar uma continuidade e escrevermos o “erros…2” daquele artigo. Para ampliarmos a indignação para ver se mudamos as coisas. Sabemos que não somos o primeiro, e temos um bom amigo que já falou sobre isso há mais de uma década.

Há diversos assuntos abordados em nossos cursos e livros que merecem uma observação. O problema é a falta de estudo, leitura e interesse. Por exemplo, a maioria esmagadora dos profissionais de comércio exterior trabalha hoje com carga geral. E com container. Assim, como não se vai muito atrás do conhecimento, e limita-se a fazer a própria rotina, aquela quase sempre mal passada ou ensinada, as pessoas já não sabem mais nem o que significam determinados importantes termos de frete.

Quando se reserva uma praça num navio para carga geral e container, já não se sabe mais o que são as condições de frete. Aqueles “famosos termos” Liner Terms (LT); Free in (FI); Free Out (FO) e Free In and Out (FIO). Bem como suas variações. Assim, quando se reserva a praça, não é comum verificar se o frete é Liner Terms (o que é normal nessa situação, mas não obrigatoriamente). Com isso, pode-se vir a ter péssimas surpresas ao final do processo.

Lembramo-nos bem de uma situação já bem distante. Em 1996. Em que tínhamos uma empresa de navegação com quem quase nunca embarcávamos nossos containers. Ela dificilmente tinha frete para nós. Era normalmente mais caro. Um dia, “de repente, não mais que de repente”, como diria o “Poetinha”, o seu frete era mais baixo. Estranhamos e perguntamos se o frete era Liner Terms, já que era para container. Qual não foi nossa surpresa ao sermos indagados pelo agente marítimo, o que era isso.

Pasmos, mas, compreensivos, explicamos o que era e pedimos que verificasse então se era LT. No dia seguinte tivemos a informação esperada, de que não era. E pela simples razão de que aquele porto de destino era um tanto complicado. Demorava-se demais para descarregar, mais que o tempo normal e necessário, dando despesas extras ao armador. E que para aquele porto o frete era, portanto, “Free Out”. Ou seja, o exportador ou importador, dependendo do Incoterms envolvido, teria que pagar a despesa de desembarque fora do frete, já que não estava na cotação, que para isso teria que ser LT. Portanto, fosse alguém menos familiarizado, ou novato, teria “entrado” naquele frete mais baixo, no entanto “mais caro” no final. Em que as aparências enganam e nem tudo que reluz é ouro”.

Os demais termos, então, que se usam nos afretamentos de navios, são ilustres desconhecidos. Parecendo que não existem, e que essas pessoas jamais trabalharão em outra empresa e com outro tipo de carga, a granel por exemplo.

Quando vemos a questão do Incoterms é desesperador. Sempre dizemos que é provável que possamos contar nos dedos das mãos aqueles que conhecem Incoterms como manda o figurino. Ou pelo menos um pouco mais. A coisa mais comum é encontrar pessoas que acham que o significado de uma venda CFR – Cost and Freight – Custo e Frete, em que se menciona o porto de destino, e cobre-se o frete até lá, é que o exportador entrega a mercadoria lá. Quando, em realidade, a entrega ocorre no país do vendedor. O mesmo ocorre com outros termos, por exemplo, CIF –Cost, insurance Freight – Custo, seguro e frete. Aqui mais ainda.

Quando se pergunta quantas vias originais têm um conhecimento de embarque marítimo, é uma tristeza. A resposta categórica é sempre “três vias”, o que não é verdade. Também três. Além de se achar que o conhecimento de embarque se chama Bill of Lading (B/L), o que não é verdade. É também o B/L. Como se sabe quantas vias originais foram emitidas e se todas foram entregues é bom nem perguntar.

Quantos profissionais devem existir que, trabalhando com carta de crédito, não têm a menor idéia do que é a Publicação 600 da International Chamber of Commerce (ICC), que rege as cartas de crédito. Nem vamos falar da ISBP – International Standard Banking Practice (ISBP) – Prática Bancária Padrão Internacional, quase desconhecida.  Que é a Publicação 745E da CCI, que interpreta a Publicação 600.

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Author: Samir Keedi

-Mestre (Stricto Sensu) e pós-graduado (Lato Sensu) em Administração pela UNIP-Universidade Paulista. -Bacharel em Economia pela PUC-Pontifícia Universidade Católica. -Profissional de comércio exterior desde março de 1972. -Especialista em transportes; logística; seguros; Incoterms®; carta de crédito e suas regras; documentos no comércio exterior; contratos internacionais de compra e venda. -Generalista em várias atividades em comércio exterior. -Consultor em diversos assuntos relativos ao comércio exterior. -Professor universitário de graduação e pós graduação desde 1996. -Professor e instrutor técnico desde 1996. -Palestrante em assuntos de comércio exterior e economia. -Colunista em jornais e revistas especializadas. -Autor de vários livros em comércio exterior. -Tradutor oficial para o Brasil do Incoterms 2000. -Representante do Brasil na CCI-RJ e Paris na revisão do Incoterms® 2010.

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