Estabilidade e crescimento são incompatíveis? Em 1999 isto vai mudar?

 

Os últimos pouco mais de sete anos da vida brasileira assistiram algo quase impensável até então, que é a estabilidade da nossa moeda. Considerando o passado é, sem nenhuma sombra de dúvida, um grande avanço já que a inflação é um imposto insuportável e inadmissível.

Mas além disto o que vimos? Pode-se dizer que nada de notável, muito pelo contrário, o Brasil sofreu deteriorações numa série de campos. Não precisamos nos esforçar muito para lembrarmo-nos de apenas alguns deles, como os retrocessos na saúde, educação e emprego,  na elevação dos impostos além do nível suportável, no aumento dos gastos e déficits públicos, no brutal aumento da dívida interna, na inversão de nosso comércio externo, agravamento das desigualdades sociais, etc. etc. Até o black out no Brasil já é realidade. Pobre Thomas Alva Edison, criador da lâmpada.

A manutenção rígida da estabilidade da moeda trouxe enormes sacrifícios e dissabores à vida brasileira, de cujos efeitos ninguém se livrou. É claro que ninguém nunca desejou o retorno da inflação, cujos efeitos devastadores são mais do que conhecidos, e queremos mantê-la sempre distante. Mas será que a manutenção da moeda a todo custo tinha que ser feita em cima do desastre econômico que assistimos?

Mais do que isto, será que a manutenção da moeda por tanto tempo teria que levar necessariamente ao diminuto crescimento que tivemos?

É claro que a minha resposta é não. É só analisarmos o que tem ocorrido no resto do mundo, principalmente nos vizinhos do norte e na Europa, para concluirmos que estabilidade e crescimento nunca foram incompatíveis. Todos estes países tem experimentado uma baixa taxa de inflação aliada a crescimento. O caso do EUA é bem ilustrativo, tendo apresentado crescimento por quase 10 anos, aliado a pequenas taxas de inflação, juros e desemprego sempre em queda. Em síntese, grande prosperidade na última década. Já já o resto do mundo, em especial o irmão do norte, estarão em alta novamente, como costume.

Então, se lá fora tudo funciona, porque o atual governo brasileiro sempre elegeu o crescimento como nefasto e procurou evitá-lo de todas as formas, mantendo o interesse apenas na manutenção da inflação a baixos níveis? Quais interesses nos levaram a esta situação? A quem interessava um Titanic? Por que esta pergunta nunca foi respondida criando, inclusive, condições abertas para que nossos problemas pudessem se potencializar, caminhando o país, quase irremediavelmente, para uma situação insustentável e de quase convulsão social? Já são duas décadas perdidas, quase uma geração. Não podemos perder a terceira já que isto representará uma geração inteira, passando o Brasil dos avós para os netos.

No início de 1999, finalmente, e felizmente, ainda que por linhas tortas, chegamos a atual situação de câmbio livre, onde o mercado, soberano, passou a decidir qual é o preço da moeda, e hoje um número muito maior de agentes econômicos ajuda a definir o destino do país, e não apenas uma lenta burocracia estatal. Ainda que uma política dessa signifique problemas, são sempre menores do que aqueles causados pelo Estado, com certeza.

O desenvolvimento, se o governo deixasse e não atrapalhasse mais, seria só uma questão de tempo, e parecia ter recomeçado em 2000, embora lentamente, a despeito dos opositores. Sem planejamento, e contra a vontade de muitos, já que foi uma explosão natural de mercado, esta nova situação trouxe à economia uma chance de redenção, principalmente através da exportação que parecia estar sendo retomada fortemente, permitindo voltar a sonhar com o número mágico de 100 bilhões de dólares, ainda que não para 2002.

É claro, porém, que muito mais teria que ter sido feito. Na questão dos juros, seria necessário que fosse civilizado, criando condições às empresas de retomada dos investimentos e criação de empregos, de modo a reduzir a enorme massa de desempregados criados pela teimosia. Seria preciso realizar de vez, e sem hipocrisia, a reforma tributária, e o governo poderia ter aproveitado a grande chance mais uma vez perdida para realizar o tão desejado ajuste fiscal adequado e definitivo. Com isto teria parado de recorrer a remendos, principalmente, os infindáveis aumentos de impostos como se o governo não fosse o povo, mas sim oponente e inimigo.

Houve bons e oportunos momentos para pedir aos agentes econômicos, como ocorreu com o câmbio, que ajudassem a definir a taxa de juros ideal para a economia, bem como a carga tributária ideal, mas não foi feito.

Tudo o que estiver ao alcance sempre deve ser tentado, e o governo tem a obrigação absoluta de criar chances de promoção do crescimento e bem-estar da população deste sofrido país, de modo a reduzir o preço a pagar, para que não se torne tão alto que não possa mais ser negociado.

Mas ao invés disto o que está ocorrendo novamente? Mais problemas e, agora, com novo ingrediente. Com a falta de energia desaparecem as cores e tudo volta a ser negro, ou quiçá cinza, se a coisa não for tão grave, o que não parece ser o caso.

jornal Perspectiva

Author: Samir Keedi

-Mestre (Stricto Sensu) e pós-graduado (Lato Sensu) em Administração pela UNIP-Universidade Paulista. -Bacharel em Economia pela PUC-Pontifícia Universidade Católica. -Profissional de comércio exterior desde março de 1972. -Especialista em transportes; logística; seguros; Incoterms®; carta de crédito e suas regras; documentos no comércio exterior; contratos internacionais de compra e venda. -Generalista em várias atividades em comércio exterior. -Consultor em diversos assuntos relativos ao comércio exterior. -Professor universitário de graduação e pós graduação desde 1996. -Professor e instrutor técnico desde 1996. -Palestrante em assuntos de comércio exterior e economia. -Colunista em jornais e revistas especializadas. -Autor de vários livros em comércio exterior. -Tradutor oficial para o Brasil do Incoterms 2000. -Representante do Brasil na CCI-RJ e Paris na revisão do Incoterms® 2010.

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