A OMC, o Brasil e os seus erros

O Brasil acaba de conquistar um troféu internacional. Claro que não é bem o que queria. Este é de consolação, na falta do importante e mais desejado. Há mais de 10 anos o país quer, desesperadamente, uma vaga no Conselho Permanente de Segurança da ONU. É incrível a luta pelo cargo, quando o mesmo não ocorre para melhorar o país. É só desejo de aparecimento internacional. E cada brasileiro de bom senso sabe disso. Além de desejar algo que nem países como Japão e Alemanha tem. É só gasto de energia sem sentido.

No momento, como troféu de consolação, ganhamos o cargo máximo de direção geral da OMC – Organização Mundial do Comércio, na esperança da ONU no futuro. Algo pelo qual não deveríamos, em nossa modesta opinião, ter lutado tanto por ele nos últimos meses. E as razões são bem simples, que descreveremos a seguir. Não que o país não deva almejar visibilidade internacional. Que não deva tentar intervir nos destinos do mundo e tentar melhorá-lo. Claro que deve. Mas, certas coisas, têm limite. É preciso zelar pelo bom senso. Antes, devemos aparecer ao mundo pelos bons exemplos. Por melhorar a vida do povo. Por ser exemplo em educação, saúde, etc., em especial comércio exterior.

Para começar, não deveria ter havido a intervenção forte da presidência. Nem do Itamaraty. Com convencimento para apoio maciço, segundo se soube, de países da África e do Caribe. Todos sem nenhuma representatividade no comércio exterior. Isso deveria ser uma questão de comércio e não de governo e política. Acabamos de politizar a geografia comercial mundial. Dividimos o mundo, sem necessidade, em hemisfério norte e hemisfério sul. Abrindo uma frente de discordância que não levará a nada. A direção da OMC deve ser um desejo dos players do setor, de comércio, e não de governos.

O Brasil não é exemplo de economia aberta para ditar regras internacionais. A OMC luta por comércio livre, aberto, simples. Somos uma economia extremamente fechada, que não condiz com o que poderíamos ser. Somos mais ou menos 3% da economia mundial, idem na população e, se não nos enganamos, no território. E somos apenas 1,3% do comércio mundial, e em queda. O que ocorreu em 2012 com relação a 2011, e está ocorrendo novamente neste ano de 2013.

Temos, nos tornado, também, cada vez mais protecionistas. O que também não condiz com a filosofia da OMC de liberdade de comércio. Também, como se pode verificar, e todos da área sabemos, somos um país praticamente avesso a acordos internacionais. Temos o mínimo, quase restrito à América do Sul, com México na América do Norte. E com este, temos três acordos, que nem são abrangentes, o que é incompreensível. E, fora nosso continente, apenas dois acordos com Israel e Índia, que não é nenhum primor de acordo.

Além do que, somos um governo muito intervencionista. O governo vem intervindo cada vez mais na economia, não permitindo o seu livre exercício pelos entes econômicos. E criando cada vez mais empresas estatais, retornando aos velhos anos de 1960, 1970, quando tivemos centenas de empresas estatais. A OMC é um órgão de liberalização do comércio.

A OMC está perdendo cada vez mais sua importância. A sua capacidade de unir os países na liberação do comércio é cada vez menor. Os países, diante da quase nenhuma importância do órgão, dispararam a realizar acordos bilaterais. Ou multilaterais. Tudo longe da OMC. Já há mais de 300 acordos desse âmbito no mundo. Em que a importância da OMC é seu registro como acordo válido.

Os EUA, após o lamentável fracasso da ALCA – Área de Livre Comércio das Américas, impetrado pelo nosso atual governo de plantão, já quase eterno, depois de tantos anos de negociação entre os EUA e Brasil, se voltaram também a acordos bilaterais. E, agora, por mal dos pecados, conforme artigo recente nosso, estão em negociação para a realização de um acordo com a UE – União Européia. Donos, em conjunto, de metade do PIB – produto interno bruto mundial. O que esvaziará mais ainda a OMC. E ainda, ao que parece, há mais um em andamento, abrangendo países do Oceano Pacífico.

O Brasil deseja reabrir a Rodada Doha, iniciada há uma dúzia de anos e que nunca evoluiu. Ficar no passado ao invés de avançar é começo com mau sinal. Além disso, pelos prognósticos atuais, a reunião ministerial de Bali, em dezembro próximo, não tem futuro alvissareiro, pelo menos por ora.

Assim, vemos que pegamos na mão uma verdadeira bomba relógio, ou seja, péssima hora para liderar a OMC. Não precisaríamos partir para uma missão política e suicida neste momento.

Se o novo diretor geral da OMC, nosso brasileiro eleito, conseguir reverter todas estas contrariedades se transformará, sem dúvidas, no melhor diretor a já ter dirigido a entidade. No entanto, considerando a situação brasileira retro descrita, um eventual sucesso deverá ser creditado, claro, simplesmente a ele e não ao país que não tem qualquer condição de liderar e fazer algo pela OMC.

Obviamente, torceremos para que dê tudo certo, e para que a gestão seja um sucesso. Para o bem do mundo. E, claro, para o bem do Brasil, pois um sucesso poderá ter significado mudanças na orientação do nosso comércio exterior, com mais esperanças para o futuro, que hoje é um tanto cinza escuro, numas 85 tonalidades.

Jornal Diário do Comércio

Jornal DCI (OMC, Brasil e os erros)

Revista Mundo (OMC, o Brasil e os erros)

Author: Samir Keedi

-Mestre (Stricto Sensu) e pós-graduado (Lato Sensu) em Administração pela UNIP-Universidade Paulista. -Bacharel em Economia pela PUC-Pontifícia Universidade Católica. -Profissional de comércio exterior desde março de 1972. -Especialista em transportes; logística; seguros; Incoterms®; carta de crédito e suas regras; documentos no comércio exterior; contratos internacionais de compra e venda. -Generalista em várias atividades em comércio exterior. -Consultor em diversos assuntos relativos ao comércio exterior. -Professor universitário de graduação e pós graduação desde 1996. -Professor e instrutor técnico desde 1996. -Palestrante em assuntos de comércio exterior e economia. -Colunista em jornais e revistas especializadas. -Autor de vários livros em comércio exterior. -Tradutor oficial para o Brasil do Incoterms 2000. -Representante do Brasil na CCI-RJ e Paris na revisão do Incoterms® 2010.

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